Caro Senador Paulo Paim
Relator do PL 98/2011
Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal
Nós, organizações de jovens camponeses e camponesas, de trabalhadores
e trabalhadoras rurais, dos povos das águas, do campo e das florestas,
viemos publicamente manifestar algumas questões em relação ao Estatuto
da Juventude.
Em primeiro lugar, consideramos fundamental e estratégica a aprovação
deste estatuto, desde que possibilite condições para as juventudes se
desenvolverem e caminharem em uma perspectiva de autonomia e
emancipação. Reconhecemos que no atual texto há um conjunto de artigos
que auxiliam na promoção de direitos para o conjunto das juventudes, e
que contemplam também a juventude rural.
É necessário entender que o meio rural brasileiro e as e os jovens
que vivem nesse espaço, tem especificidades e singularidades, que
necessitam ser lembradas no momento de aprovar uma carta de direitos que
abarque a diversidade social brasileira.
Na leitura que realizamos sobre o PL 98/2011, o Estatuto da
Juventude, observamos que em relação à juventude rural existem apenas
duas (e insuficientes) menções: uma quando se refere ao transporte
escolar, que é necessário, mas que reforça a idéia de um projeto de
esvaziamento das escolas do campo, e outro artigo que se refere à
inserção produtiva da juventude nos mercados de trabalho e econômico.
Consideramos que é estratégico para o país ter um projeto de
desenvolvimento social no qual se viabilize os projetos de vida na
agricultura familiar e camponesa, bem como se promova a soberania
alimentar do povo brasileiro.
Assim faz-se necessário que o Estatuto tenha em seu conteúdo questões
relativas ao: direito a terra e a promoção da Reforma Agrária, o
fortalecimento da Educação do campo e no campo, o apoio a uma
agricultura livre de agrotóxicos, a consolidação de relações
trabalhistas que promovam a dignidade dos assalariados rurais, o direito
ao esporte, lazer, acesso a equipamentos culturais e à saúde,
apropriados à diversidade dos modos e contextos de vida dos e das jovens
que vivem no espaço rural brasileiro.
Evidencia-se que cerca de 2 milhões de pessoas deixaram o meio rural
nos últimos anos (2000-2010), sendo que 1 milhão da população que
emigrou está situada em outros grupos etários (crianças, adultos e
idosos) e cerca de 1 milhão são pessoas em idade considerada jovem, isto
é, metade da emigração do campo para a cidade é do grupo social etário
considerado pelo novo estatuto.
Segundo a PNAD (2011), das cerca de 8 milhões de famílias que residem
no meio rural, 6,5 milhões sobrevivem com até três salários mínimos e
apenas 147 mil famílias sobrevivem com uma renda de mais de 10 salários
mínimos e até mais de 20 salários. Trata-se apenas de um dos
demonstrativos da desigualdade social que ainda temos no meio rural
brasileiro.
Ainda, os índices mais baixos de alfabetização, de ensino formal e de
acesso ao ensino superior estão entre os jovens do campo. A lógica de
trabalho e de vida do campo é diferente da cidade, portanto, deve ser
respeitada, e um projeto de educação formal que reconheça e seja
apropriado ao contexto de vida das pessoas deve considerar isso.
A lamentável constatação de que nos últimos 10 anos foram fechadas
mais de 37 mil escolas no campo é um alerta para que se pensem meios
institucionais de garantir o sistema público de educação do campo, e não
que os (as) camponeses (as) tenham que sair do meio rural para acessar o
sistema de ensino.
Desse modo, é essencial e necessário que o Estatuto da Juventude
tenha interface e fortaleça a importância e a necessidade da educação do
campo.
A estatística e o reconhecimento de que somos o país que mais utiliza
agrotóxicos no mundo atinge diretamente os e as jovens do campo, que,
por falta de opção na maioria dos casos, muitas vezes são manipuladores
(as) e lidam diretamente com os venenos. Se a população de maneira geral
consome em média 5 litros anuais de agrotóxicos que estão inseridos na
alimentação, podemos somar aos jovens do campo uma quantidade a mais,
por trabalharem neste sistema.
Assim, é importante que no Estatuto da Juventude sejam observadas
estas questões que comprometa o Estado a proteger os jovens do uso dos
agrotóxicos e para isso é necessário que sejam formuladas iniciativas
que permitam ao país uma transição para técnicas consideradas
sustentáveis, dignas e saudáveis de produção agropecuária associadas à
agroecologia.
A violação dos direitos trabalhistas no campo é um tema preocupante.
Por mais que a legislação trabalhista ofereça uma suposta proteção
social aos trabalhadores rurais, os freqüentes casos de trabalho análogo
à escravidão nos indicam que é necessário combater a desigualdade
social, para que as pessoas não precisem se submeter a essa relação de
trabalho.
Apenas com investimentos pesados na agricultura familiar e camponesa,
para que o jovem rural não necessite procurar trabalhos insalubres, é
que iremos superar este grave problema social.
É importante também que o estatuto contemple ações para o combate a
todas as formas de violência contra os jovens no campo, principalmente
as praticadas contra as jovens mulheres.
Nascemos da terra, dela nos sustentamos, e por ela lutamos. Que o
Estatuto da Juventude seja um marco legal que reconheça a juventude
rural na sociedade e seja um documento no qual conste o direito a
acessar a terra; a estudar sem precisar sair do campo; a produzir sem
utilizar venenos e a trabalhar de forma justa e digna!
Brasília, Março de 2013.
Assinam a nota:
PJR - Pastoral da Juventude Rural
CONTAG - Confederação dos Trabalhadores da Agricultura
MST - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
FETRAF - Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar
MPA - Movimento dos Pequenos Agricultores
UNICAFES - União Nacional de Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária
Rede de Jovens do Nordeste
CPT - Comissão Pastoral da Terra
MAB - Movimento dos Atingidos por Barragens
MMC – Movimento das Mulheres Camponesas
UNEFAB – União Nacional das Escolas Família Agrícolas do Brasil
REDE CEFFAs – Centro Familiares de Formação por Alternância
PJ - Pastoral da Juventude
PJE - Pastoral da Juventude Estudantil
PJMP - Pastoral da Juventude do Meio Popular
FEAB - Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil
ABEEF - Associação Brasileira dos Estudantes de Engenharia Florestal
SERTA - Serviço de Tecnologias Alternativas
ADESSU – Baixa Verde
Diretoria de Políticas para Juventude da FETAPE
Associação Nacional da Juventude Rural
Centro Sabia
Via Campesina Brasil